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Vamos Comprar um Poeta - Afonso Cruz (resenha)

quinta-feira, 5 de agosto de 2021

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Vamos Comprar um Poeta é um livro com uma carga de crítica pesada sobre o materialismo, consumismo e utilitarismo das coisas que ao final deixa-nos verdadeiramente impactados com a história narrada. Fenomenal. Entrou para meus favoritos!

Saudações Leitores!

VAMOS COMPRAR UM POETA (2016) do escritor português Afonso Cruz é mais um livro que leio desse autor, isso porque eu não sabia que ele tinha outros livros publicados no Brasil, mas quando soube já comprei e, imediatamente, li esse volume. A propósito, minha primeira experiência com o escritor foi com o livro Flores (que li em 2016).

Em VAMOS COMPRAR UM POETA nos deparamos com uma chocante sociedade que valoriza, mais do que qualquer outra coisa, o materialismo e que ao contrário de nossa realidade atual em que criamos pets, a sociedade criada por Afonso Cruz "criam" artistas em vez de animais de estimação.

Além disso, tudo o que existe nesse universo é patrocinado por empresas e tudo o que é possível medir com números é supervalorizado, ou seja, tudo é contabilizado durante o dia: a quantidade de grãos comidos, os passos dados, os afetos, etc.. Outro detalhe importante é que até mesmo as pessoas são identificadas por números! (BB9,2; N7468,1734; etc.) e pela contribuição que elas podem dar ao mercado de consumo.

"Dizem que é bom transacionarmos afetos, lida as pessoas e gera uma espécie de lucro que, não sendo um lucro de qualidade, já que não é material e não é redutível a números ou dedutível nos impostos ou gerador de renda, há quem acredite - é uma questão de fé -, que pode trazer dividendos."

Mas estou me antecipando muito, pois ainda não falei exatamente o que encontraremos em VAMOS COMPRAR UM POETA, porém, precisava exibir inicialmente o cenário que o autor criou. Sendo assim, no volume, acompanharemos uma menina que mora com seus pais e seu irmão, essa menina mensura tudo o que faz durante o dia e é através dos olhos dela - da narrativa em primeira pessoa - que vamos acompanhar a história.

Fica bem claro que na casa dessa menina o pai é o provedor, a mãe cuida de casa e a menina e o irmão são estudantes, nessa perspectiva, tudo o que acompanham durante o dia e conversam é sobre números, coisas patrocinadas, tamanho e economia, há uma preocupação exagerada por coisas que tenham utilidade.

"Gostava de ter um poeta, e depois? Há muitos estudos que afirmam que ter um artista, um bailarino, um ator, ou mesmo um poeta, ajuda a combater o stress, a baixar o colesterol mau, o que nos torna cidadãos e profissionais mais produtivos, concentrados e eficazes. Ora bem, nada mais útil do que isso."

No entanto, no seio dessa família uma transformação irá acontecer quando a menina vê que há pessoas que compram artistas porque observam que isso pode trazer alguma satisfação imaterial, então, ela pede ao pai para comprar-lhe um poeta, então, pai vai com a menina no centro comercial para efetuar a compra, e a forma como a transação acontece é estarrecedora, como se de fato estivessem comprando qualquer objeto e não um ser humano.

O poeta se adapta bem na rotina familiar, tem seus momentos de divagação, mas após ele ir morar no apartamento, a vida de todos os membros da família não será mais a mesmas, principalmente porque ninguém compreende o que o poeta diz, pois ele usa mais palavras (sentimentais e metafóricas) do que números, depois porque a rotina familiar muda e há sempre uma novidade na casa.

"Percebi que estava cada vez mais inutilista e que pensava em coisas só pela sua beleza e não queria saber do seu valor monetário ou instrumental."

Porém, a menina se vê sofrendo bullying na escola por ter comprado um poeta que, para todos, não serve para nada, a menina tenta explicar a "serventia" do poeta, mas é acusada e inutilista, o que ela considera humilhante, agressivo e a deixa revoltada, pois ela está começando a ver a vida de outra maneira.

O poeta também tem suas sofrências, pois em casa a mãe e o pai brigam com ele, passam o tempo todo pedindo para ele se retirar e quando ele vai para a rua é apedrejado e desvalorizado por todos. Nesse ínterim a menina observa tudo isso e outras coisas que antes não tinha se detido para observar.

"Na escola acusaram-me inclusivamente de pronunciar frases ambíguas. Nunca me senti tão humilhada."

É também nesse momento que ela começa a entender melhor o que o poeta fala e começa a também falar coisas que as pessoas de "seu mundo" não conseguem entender, mas se você pensa que a história acaba por aí temos um plot quando um problema chega na casa e todos precisam reduzir seus números de consumo, sendo que a resolução dessa problemática é o que traz a verdadeira crítica bem humorada que Afonso Cruz quis lançar para seus leitores.

De fato o autor deixa bem claro que no dia a dia nem tudo deveria se voltar para números, finanças, consumo, ou mesmo estudos/pesquisas e estatísticas, porque o bem-estar e a felicidade não estão intrinsecamente relacionados a isso, viver desse modo maquinal torna-se até mesmo superficial, robótico e sem a perspectiva de nenhum prazer.

"O poeta dizia que os versos libertam as coisas. Que quando percebemos a poesia de uma pedra, libertamos a pedra da sua "pedridade". Salvamos tudo com a beleza. Salvamos tudo com poemas. Olhamos para um ramo morte e ele floresce. Estava apenas esquecido de quem era. Temos de libertar as coisas. Isso é um grande trabalho."

Afonso Cruz traz de maneira fenomenal uma reflexão sobre o utilitarismo, materialismo, consumismo e capitalismo, ressaltando que o mundo pouco valoriza o papel da arte, pois seu valor é mais emocional do que material, embora a mesma arte que não pode ser tão mensurada, mobiliza muito de nossa sociedade, ademais, é da arte que é possível encontrar soluções práticas e ideias para problemáticas cotidianas. É uma pausa, um respiro do cenário caótico que vivemos.

Em VAMOS COMPRAR UM POETA, também encontramos crítica à falta de importância ou a desvalorização dos sentimentos, justamente por ele não poder ser colocado em números e até mesmo por ter se tornado algo tão fugaz, a forma como o autor nos conduz a fazer várias reflexões no livro é de nos deixar verdadeiramente impactados e transformados ao final do volume.

Será que ainda resta dúvida se eu gostei desse livro? EU AMEI e entrou pros meus favoritos, sem dúvida, esse livro é um daqueles que a cada releitura me mostrará algo novo.

FICHA TÉCNCIA
Vamos Comprar um Poeta
Autor: Afonso Cruz
Porto Alegre: Dublinense
2020 | 96 págs.

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