Essa é o primeiro livro que li da Carola Saavedra, até um tempo atrás eu nem sequer conhecia essa escritora, mas a conheci quando a Nana, uma garota que sigo no skoob [que tem os mesmos gostos que eu], adicionou, leu esse livro e comentou que ele era muito bom e que indicava o livro para quem gosta de Clarice Lispector, não bastou outra indicação. Solicitei o livro para a Companhia das Letras e quero agradecer muito a editora por ter me enviado para eu poder resenhar para vocês, confiram!
Paisagem
com Dromedário, Carola Saavedra, São Paulo: Companhia das Letras,
2010, 168 pág.
Paisagem com
Dromedário escrito pela escritora e
tradutora chilena Carola Saavedra, radicada no Brasil, pois aos três anos de
idade veio para o país. Atualmente vive no Rio de Janeiro, mas já morou na
Espanha, França e Alemanha. Ao todo já publicou quatro livros: Do Lado de Fora (2005), Toda Terça (2007), Flores Azuis (2008) – prêmio APCA de melhor romance – e Paisagem
com Dromedário (2010) – prêmio Rachel de Queiroz, categoria jovem autor.
A autora também já ficou entre os finalistas dos prêmios São Paulo de
Literatura e Jabuti. Carola também teve dois de seus romances publicados no
exterior e já participou de várias antologias.
O livro é narrado em primeira pessoa, pela personagem
Érika que está numa ilha vulcânica não identificada. A narrativa acontece toda
através de gravações que Érika faz para Alex, um artista plástico com o qual
vivia um triângulo amoroso entre ela, Karen e, claro, Alex. Na verdade o leitor
nem chega a saber se as gravações chegam até Alex ou não. Podem caracterizar-se
apenas como um monólogo e um desabafo de Érika para Alex sem a pretensão de que
ele os ouvisse.
"[...] o ruim de falar em vez de escrever é isso, a gente fala e
logo em seguida esquece o que disse, então o que a gente diz é sempre novo,
desconectado de qualquer lógica anterior, de qualquer contexto. É como se
escrevêssemos com uma das mãos, e com a outra fôssemos imediatamente apagando o
escrito. E o que a gente diz passa a não fazer muito sentido." (p.12)
No decorrer da narrativa e das divagações de Érica nas
gravações sabemos que ela viajou para essa ilha, para ficar na casa de seus
amigos Vanessa e Bruno apenas para fugir da realidade imutável que era a doença
e morte de sua amiga e amante de Alex: Karen. Logo que Karen diz que está com câncer
Érika não aceita bem a notícia e passa a fugir, se esconder e negligenciar tudo
o que tivesse a ver com Alex e Karen.
Ela se auto exila e as gravações nada mais são do que
uma tentativa de tentar descobrir a si mesma e aos outros e não como uma
extensão de Alex. Aparentemente todos os amigos nunca a tratam como ela, mas
apenas Alex e Érika, como se ela fosse uma extensão dele.
"Agora, penso, já percebeu que são justamente esses momentos,
quando tudo parece perfeito, que antecedem os acontecimentos mais assustadores,
as piores tragédias? Talvez toda felicidade tenha um fundo falso, uma
tonalidade artificial, e esteja ali apenas para contrastar com o que está por
vir." (p.32)
O livro traz vários questionamentos sobre vida e morte
e questões existenciais e sobre o amor. Paisagem
com Dromedários é uma ficção que mostra o quanto as pessoas são
atormentadas por seus questionamentos quando realmente param para pensar sobre
eles.
Érika me cativou pela sua honestidade, por abrir-se de
corpo e alma ao que sentia e mostrar-se arrependida e ao mesmo tempo não
esconder seu egoísmo e medos. O livro tem uma narrativa monológica e não há
diálogos a não ser partes de conversas que Érika recordava, há toda uma descrição
teatral e mágica nas gravações.
"A gente quer tantas coisas, ou acha que quer tantas coisas, e,
quando chega a hora, percebe que não queria tanto assim, ou que não era bem
aquilo, ou que na realidade quer justamente o contrário. O querer me parece
algo tão misterioso." (p.148)
Outro ponto que me chamou atenção foi a capa do livro
que apesar de simples mostra a delicadeza e a originalidade do que será mostrado
no conteúdo da obra. Apesar de este ser meu primeiro contato com a obra de
Carola, vejo seu potencial como escritora e desbravadora dos sentimentos e da
alma do ser humano.
Em suma, Paisagem
com Dromedário é um livro encantador e na medida em que a
narrativa-monólogo egocêntrica da narradora personagem avança vão surgindo
questionamentos e curiosidades sobre a vida da enigmática Érika e sua relação
conturbada com Alex e Karen, além de nos fazer refletir sobre nossas próprias
relações sociais, o quanto doamos ou não doamos aos outros.
"É que as relações só existem assim. A três. É sempre necessário
um terceiro, que, ao ser excluído, possa, através da sua ausência, estabelecer
um elo entre os outros dois. Sempre alguém tinha que ser excluído." (p.36)
Camila Márcia